Novo trabalho dirigido por João Turchi questiona morte, ressurreição e o legado de histórias interrompidas.
O premiado grupo de performance MEXA apresenta seu mais novo espetáculo, A Última Ceia, em temporada de estreia na Casa do Povo, em São Paulo, de 17 de outubro a 3 de novembro de 2024. Inspirada no célebre quadro de Leonardo Da Vinci e no contexto bíblico da última ceia, a peça-jantar reflete sobre temas de morte, ressurreição e a persistência das narrativas que sobrevivem ao desaparecimento dos corpos.
Dirigida e escrita por João Turchi, a montagem parte de um cenário icônico para criar um paralelo com as experiências pessoais e coletivas do grupo. O espetáculo se apropria do simbolismo da Última Ceia, mesclando momentos autobiográficos e episódios marcantes da trajetória do MEXA. “Como criar uma imagem final que persista, ainda que aquele grupo não exista mais? Essa é a pergunta que norteia o espetáculo”, explica Turchi.
Dividido em dois atos, A Última Ceia inicia com uma atmosfera de peça-palestra, onde as atrizes, todas com fortes vínculos com a religião, compartilham suas histórias relacionadas ao quadro de Da Vinci. Aos poucos, o espetáculo toma rumos inesperados, misturando realidade e ficção enquanto as relações entre as performers se desmantelam. Nesse processo, o cenário é desmontado, e o público se depara com a desconstrução da própria obra.
No segundo ato, o palco se transforma em uma grande mesa de jantar, e o público é convidado a participar da ceia final. Esse momento marca a tentativa do grupo de concretizar todas as promessas feitas ao longo da peça. Durante o jantar, são servidos pratos tradicionais, como o favorito do morto nos velórios do Maranhão, em uma referência às tradições de despedida.
A montagem é permeada por relatos pessoais das integrantes, como a história de Patrícia Borges, que trocou vestidos e perfumes para conseguir uma reprodução do quadro de Da Vinci, ou as memórias de Suzy Muniz, cujo pai trouxe um quadro da Última Ceia para casa, gerando temor em sua mãe, que acreditava que a pintura trazia maus espíritos.
Essas narrativas pessoais trazem autenticidade à peça, que se insere na linha de pesquisa do MEXA, sempre interessado em borrar as fronteiras entre realidade, ficção e teatro documentário. Conhecido por abordar questões ligadas à vulnerabilidade social e à performance autobiográfica, o grupo, fundado em uma casa de acolhida em São Paulo, transita entre a arte e a vida.
O MEXA tem uma trajetória consolidada no cenário da performance contemporânea. Desde sua criação em 2015, o grupo já participou de festivais internacionais e se apresentou em diversos países. A Última Ceia já passou por cidades como Bruxelas, Berlim e Lisboa antes de sua estreia nacional.
Turchi enfatiza que a peça-jantar é, ao mesmo tempo, uma despedida e uma celebração da trajetória do coletivo. "Se essa for nossa última peça, queremos controlar qual é a imagem que vamos deixar para o mundo", diz o diretor, em uma reflexão sobre o legado de um grupo que sempre lidou com a finitude de suas ações.
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